sexta-feira, 28 de maio de 2010

Em cartaz: Deve um biólogo apreciar “A Marcha dos Pinguins”?


Figura 01. Fêmeas de pinguim imperador após deixarem o ovo, se dirigindo para o mar em busca de alimento. 

Figura 02. Os filhotes nascem após um rigoroso inverno e o ciclo de vida dos pinguins imperadores continua. 

            Eis a pergunta que me fiz ao comentar sobre esse documentário com alguns de meus colegas biólogos que foram severamente críticos a ele. Para quem não sabe ou não lembra “A Marcha dos Pinguins” é um documentário dirigido pelo francês Luc Jacquet lançado em 2006 que na época causou comoção nos cinemas do mundo todo, sendo indicado ao prêmio César de melhor filme e vencendo o Oscar de melhor documentário. “A Marcha dos Pinguins” conta o ciclo de vida dos pinguins imperadores no desértico gelo da Antártida, desde a busca pelo companheiro ideal até a preparação dos filhotes para a vida adulta. Interessantemente, entre os pinguins imperadores há uma inversão de papéis entre machos e fêmeas, onde a fêmea deixa o ovo para ser chocado pelo macho, enquanto vai ao mar em busca de alimento. A fêmea regressa entre a altura do nascimento da cria e até dez dias depois. Dentre as centenas de outros pinguins machos , a femea encontra o seu par através do seu chamamento vocal, passando ela a tomar conta da cria.
            Cinematograficamente falando, o documentário é esplêndido. Belíssimas e delicadas imagens, tratadas com aprumado esmero e atentas a todos os detalhes, seja dos gestos dos pinguins, seja da paisagem desértica da Antártida.  Cabe lembrar que Jacquet, com o auxílio dos seus dois diretores de fotografia (os franceses Laurent Chalet  e Jérôme Maison), filmou em condições bastante adversas, sob intensas nevascas e temperaturas que chegavam a -40°C. Acompanhando a beleza das imagens está uma brilhante edição de som e uma magnífica trilha sonora comandada pela cantora francesa Émilie Simon, que inclusive ganhou o prêmio César de melhor Trilha Sonora Original de 2006.
Mas então, qual o problema com “A Marcha dos Pinguins”? A razão da repulsa provocada pelo documentário entre os biológos é a antropomorfização dos pinguins, através de narrações humanizadas, provendo-os de sentimentos como amor, saudades, ciúmes e frustração. Em uma passagem do filme, por exemplo, vemos (e ouvimos sob a narração das atrizes Romane Bohringer na versão americana e Patrícia Pillar na versão brasileira) a pinguim fêmea lamentar a rachadura do ovo de maneira semelhante a uma mãe que perde um filho. Sinceramente, apesar de entender os problemas dessa antropomorfização, já que ela distorce as ações naturais dos animais, não vejo motivo para tanta severidade nas críticas e defendo que sim, esse documentário deve ser apreciado pelos biólogos.
            Obviamente que essa narrativa de caráter humano serve para envolver o público na luta dos pinguins para dar continuidade ao seu ciclo de vida frente às grandes dificuldades do gelo antártico. Apesar disso, não a vejo como um apelo comercial ao documentário, a encaro mais como um desafio de Jacquet em poetizar o ciclo de vida dos pinguins imperadores. E ele cumpre com esse desafio. Em nenhum momento a narrativa comete erros sobre a biologia destas aves e nem se torna piegas ou apelativa. Ela realmente nos envolve na história de maneira arrebatadora, nos emocionando com a história dos pinguins e com o ambiente em que eles vivem. Entendo que as ações dos pinguins são guiadas por um comportamento que provavelmente foi selecionado ao longo da evolução e não por sentimentos humanizados. Entretanto, não há motivo em impedir que a arte verse à sua moda sobre a natureza, ainda mais de forma tão brilhante como neste documentário. “Marcha dos Pinguins” é um bom exemplo da importância de se relacionar inteligentemente arte e ciência, no sentido de tornar a difusão dos conteúdos científicos de maneira mais interessante e atrativa. Além disso, a ciência pode se aproveitar da inestimável capacidade da arte de provocar o ser humano e fazê-lo refletir, assim como “A Marcha dos Pinguins” nos faz refletir sobre uma natureza, a qual também fazemos parte, mas insistimos em destruir.   

Sobre o autor:
Carlos Alexandre H. Fernandes é um exemplo de multifuncionalidade.  Envolveu-se com artes cênicas durante toda a sua adolescência, ao final dela descobriu sua paixão pela História, mas acabou licenciando-se em Ciências Biológicas pelo Instituto de Biociências de Botucatu da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (UNESP), onde concluiu também o seu mestrado e agora faz o seu doutorado na área de biologia molecular estrutural, estudando proteínas de veneno de serpentes. O tempo fez com que largasse o teatro, mas não as artes. Atualmente se vê envolvido com cinema e dirige um cineclube na cidade de Botucatu. Currículo Lattes.


terça-feira, 25 de maio de 2010

Museus de ciências, ensino e conhecimento científico

    Na edição desse mês da revista de divulgação científica Ciência Hoje (ed. 270) publicamos um texto na seção Ensaio discutindo a importância dos museus de ciência e tecnologia para a educação e cidadania de um povo, como essas instituições não devem ser vistas apenas como depósitos de coisas antigas e tentamos discutir como alguns conceitos tornarem-se mais claros e a desenvolver posicionamentos críticos, além de despertar o interesse dos futuros cientistas. Com o ocorrido no Instituto Butantan, pudemos perceber um pouco como a maioria das pessoas enxerga um museu e coleções biológicas, e acredito que parte do nosso trabalho seja esclarecer tais papéis para vislumbrarmos, no futuro, uma reação e engajamento diferentes da população diante do nosso patrimônio biológico, tão valioso quanto os que guardam os museus de história e artes.

   "O conhecimento científico não se resume ao contexto estritamente escolar. Essa afirmação – cada vez mais presente entre educadores em ciências – e a compreensão do que é ciência figuram como elementos importantes na construção da cidadania de um povo, que recebe informações por meio dos espaços escolares e dos veículos de comunicação, como jornais, revistas, televisão e internet. Além desses, existem outros espaços dedicados a essa finalidade? É nesse contexto que se situam os museus de ciência e tecnologia como promotores da ‘alfabetização’ científica. Esses museus têm sido objeto de diversas pesquisas, que abordam principalmente a importância de seu papel educacional e a compreensão dos processos de ensinoaprendizagem que ali potencialmente ocorrem.
   Uma pesquisa realizada pelo governo federal em 2004, com base em dados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica, indicou que a maioria dos estudantes brasileiros não lê livros, não frequenta teatros, cinemas ou museus e não percebe a existência de alternativas à escola, no que diz respeito a ciência e cultura. No mesmo ano, a pesquisa Perfil da Juventude Brasileira, realizada pela organização não governamental Instituto Cidadania em 198 municípios constatou que, do total de jovens entrevistados (entre 15 e 24 anos), 39% não iam ao cinema há mais de um ano e grande parte deles nunca tinha ido a um teatro (69%), a um museu (69%), a um show de rock (59%), a uma apresentação de dança moderna (80%), a um concerto de música erudita (92%), ou a um espetáculo de balé clássico (94%)."


Sobre as autoras:

Rafaela Lopes Falaschi é bióloga e curiosa por natureza. Continue lendo...

Mariana Galera Soler é  bióloga, professora de Ciências e Biologia, no Ensino Fundamental II e Médio, na rede particular de ensino da cidade de São Paulo e interior. Alguém que ensina que aquele monte de nomes estranhos são apenas uma pequena parte do conhecimento da incrível diversidade biológica. Currículo Lattes.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Por aí...


Simpósio internacional "Museus, Biodiversidade e Sustentabilidade Ambiental"

De 8 a 10 de Junho de 2010 

Local: Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, RJ

Dia 11 de Junho - Visitas técnicas a museus como parte da programação do simpósio








Os desafios ambientais enfrentados atualmente pela humanidade exigem uma mudança radical nos paradigmas de produção, consumo e uso dos recursos naturais, uma dura tarefa que requer participação ativa de todos os cidadãos. Existe um movimento crescente de diversos setores da sociedade pela conscientizaçã o da população, e os museus - espaços de comunicação, divulgação e educação não-formal - não podem ficar alheios a esse movimento!

Por isso, o simpósio internacional "Museus, Biodiversidade e Sustentabilidade Ambiental", organizado pelo Museu da Vida (Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz) e pelo Instituto Brasileiro de Museus/IBRAM, com apoio do CNPq, tem como principal objetivo convidar o setor museológico a refletir sobre a importância de incluir este debate nas agendas dos museus, por meio de exemplos de excelência e discussão de temas centrais, a fim de que esses espaços possam se articular internamente, entre os pares e com diversos atores externos, participando cada vez mais junto à sociedade na mitigação dos desafios ambientais.

O Simpósio reunirá palestrantes internacionais da França e Estados Unidos, bem como especialistas de diferentes estados brasileiros (Amapá, Brasília, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo), a fim de proporcionar um debate a partir de diferentes realidades, pontos de vista e abordagens.

Para se inscrever e obter informações detalhadas sobre programa e palestrantes, acesse: www.museologia. org.br/simposio. 

Profissionais pagam R$ 40,00 e Estudantes, R$ 20,00, de taxa de inscrição.

Reserve já as datas na sua agenda! O Museu Histórico Nacional fica na Praça Marechal Âncora, s/nº, Centro, Rio de Janeiro.

Contato: simposio.junho2010@ gmail.com

Problema de quem?

Todos sabemos, ou pelo menos todos deveriam saber, da tragédia no Instituto Butantan. Cerca de 70 mil espécimes da coleção herpetológica, 450 mil espécimes de aracnídeos, mais livros raros, material de consumo, muito conhecimento científico, muito trabalho e um imensurável patrimônio biológico foram queimados dia 15 de maio de 2010. 
Quem perdeu com a destruição de um monte de bichos mortos, guardados no álcool e no formol, de um monte de livros velhos e coisas do tipo? Apenas cientistas, taxonomistas mais especificamente? Ainda bem que o prédio onde ficam os estudos de venenos e relacionados à saúde ficou intacto. Infelizmente, a percepção maior que percorre a cabeça das maioria das pessoas (pelo menos das que sabem e ainda se lembram do ocorrido) é essa.
É mais difícil do que parece esclarecer o valor das coleções biológicas para toda uma sociedade. E o episódio no Instituto Butantan faz esse alerta aos berros. Poucos, muito poucos são os que sabem o real valor dessas coleções e menos pessoas ainda sabem divulgar esse valor numa linguagem clara e compreensível para a população ao redor do nosso Planeta. 
Um dos meus desafios, pessoais e profissionais, junto com alguns colegas, é levar questões "nossas", acadêmicas para muito além dos muros das Universidades e Instituições de Pesquisa. Por uma razão simples: essas questões não são nossas, são de todos. E percebemos o quão problemático é deter certos conhecimentos restritos ao nosso "grupinho". Num momento absurdamente crítico, de tamanha tragédia, nos vemos trabalhando e lidando com dificuldades quase que sozinhos.E o problema não é dos professores, alunos e funcionários do Instituto Butantan. É um problema que afeta a humanidade. Mas como "convencer" tanta gente que o que aconteceu no Butantan é uma tragédia?
Cabe a nós começarmos a procurar a resposta e trabalhar avidamente por isso e outras questões "nossas" para que numa próxima tragédia estejamos menos sozinhos...

Segue um texto publicado no "O Eco", falando um pouco da dimensão do NOSSO problema:


Biodiversidade incinerada
17/05/2010, 10:48
Por Reuber Brandão
Muitas pessoas não entendem o valor e a importância de coleções cientificas. Para muitos, parece contraditório que os mesmos pesquisadores que lutam pela conservação da diversidade biológica, também coletam e depositam exemplares em coleções zoológicas, as quais, aparentemente, são apenas locais escuros e frios, onde animais mortos permanecem empilhados em frascos de vidro. No entanto, não há nada de mórbido ou contraditório nas coleções cientificas. Muito pelo contrario, elas são parte dinâmica do processo de acúmulo do conhecimento que a humanidade possui da biodiversidade e são ferramentas essenciais na tarefa de conservação do patrimônio natural do planeta.

Coleções Zoológicas são como bibliotecas valiosas, repletas de obras raras. Essas obras raras são resultado de processos ecológicos e evolutivos. Essas obras raras são as espécies. Os organismos vivos refletem a plenitude das condições ecológicas e evolutivas do planeta e as traduzem em uma miríade de formas, nichos ecológicos e padrões de distribuição. Muitas dessas obras desaparecem de locais onde as condições ecológicas foram profundamente modificadas (na maior parte das vezes, causadas pelo homem), mas, se existem exemplares depositados em alguma coleção, o seu registro permanece de forma definitiva para qualquer objetivo de pesquisa e ensino.

Outra idéia errônea e arcaica, assume que o conhecimento existente sobre a biodiversidade é bastante satisfatório e que o encontro de novas espécies é algo extremante raro. Nessa perspectiva, um pesquisador que descreve uma nova espécie é objeto de admiração, quando, na verdade, o encontro de novas espécies é algo ainda bastante comum e este é um tipo de atividade comum para muitos zoólogos. Especialmente comum quando estudamos grupos de animais pouco conhecidos, como anfíbios, serpentes e lagartos. Estes grupos são ainda bastante carentes de estudos taxonômicos e existem diversas espécies aguardando uma descrição formal, para tornarem-se entidades biológicas reconhecidas e para serem objeto de políticas de conservação, quando necessário. Sem coleções zoológicas, tais espécies não chegarão nunca a serem reconhecidas, estudas e protegidas.

"O incêndio no Butantan foi extremamente grave. Muito grave mesmo. Tão grave quanto seria um grande incêndio em um importante museu do mundo como o Louvre, o Metropolitan, o Guggenheim, ou o British Museum. "
Desta forma, as Coleções Zoológicas são a base do conhecimento da fauna que a humanidade possui. Nas coleções estão depositados os holótipos, que são exemplares tombados no acervo que fazem a conexão entre os nomes científicos disponíveis na literatura e o tipo de animal que recebe aquele nome. Quando um animal coletado por um pesquisador chega em uma coleção, ele é comparado com holótipos e demais exemplares para verificar se se tratam de espécies novas, ou não. Sem estes holótipos (e demais tipos), e sua correta associação com os nomes disponíveis na literatura, a descoberta de novas espécies é praticamente impossível. A descoberta e descrição de novas espécies ocorre como resultado do trabalho de pesquisadores que visitam coleções cientificas, comparam cuidadosamente um grande número de animais com diversos outros e elaboram as descrições. As coleções cientificas são a maternidade e o berçário das espécies recém descritas.

Todo animal depositado em uma coleção cientifica possui dados básicos armazenados em um arquivo de tombamento, onde estão anotados, pelo menos, o número de tombamento, o nome do coletor e a data de coleta. Os dados presentes nesses arquivos indicam a distribuição da espécie, ajudam a contar a historia da pesquisa e se referem a um animal testemunho da pesquisa. Além da descrição de novas espécies e de atuarem na manutenção da estabilidade taxonômica da informação biológica, coleções cientificas ainda são utilizadas para pesquisas com dieta, biologia reprodutiva, genética, distribuição geográfica e de conservação. Como todo organismo é único, os acervos das coleções são um patrimônio insubstituível, que preserva a historia ecológica e evolutiva dos organismos incorporados. Além disso, contam a historia da pesquisa desenvolvida na instituição. 

A Coleção herpetológica do Instituto Butantan era um acervo conhecido por pesquisadores em todo mundo devido ao tamanho e relevância do material lá depositado. Quando um acervo com mais de 70 mil exemplares, coletados ao longo de uma centena de anos, e utilizado para uma gama de pesquisas em taxonomia, biologia e conservação por um enorme número de pesquisadores em todo o mundo, simplesmente desaparece em poucas horas, a palavra correta para isso é tragédia. Não é exagero considerar que o incêndio que destruiu o acervo da coleção herpetológica do Instituto Butantan representou uma das mais graves perdas de informação sobre a biodiversidade neotropical da historia da humanidade. 

A destruição de acervos durante o bombardeio de museus europeus durante a segunda grande guerra não chega aos pés do que ocorreu na fatídica manhã do dia 15 de maio de 2010. Este acidente irá atrasar o avanço do conhecimento da herpetofauna brasileira em diversas décadas. Diversos tipos zoológicos foram carbonizados, vários anos de estudos e pesquisas foram perdidos e diversos exemplares únicos e insubstituíveis foram consumidos pelas chamas. Alguns dos exemplares podem se referir a espécies que não foram mais encontradas em anos de pesquisa de campo e podem nunca mais serem registradas. Algumas espécies podem já estar extintas. Alguns dos animais foram utilizados em descrições cientificas incompletas ou deficientes e precisavam de novas atualizações que serão impossíveis. Diversos nomes científicos não estão mais ancorados a holótipos e toda taxonomia poderá ser abalada, caso os pesquisadores que detém atualmente o conhecimento empírico não tenham tempo para nomear novos neótipos (substitutos aos holótipos).

Não foi o trabalho de uma vida que foi perdido. Foi o trabalho da vida de diversas pessoas. Foi parte da história da ciência no Brasil. Foi o maior acervo de serpentes neotropicais do mundo. Por tudo isso, o sofrimento e sentimento de luto, expressado pelo Sr. Francisco Franco, curador da coleção, nas tristes entrevistas que concedeu, é a melhor expressão da tristeza que se abateu sobre os pesquisadores. Quem cuida de coleções cientificas no Brasil, não o faz pelos salários baixos. O faz por paixão e responsabilidade.

"Não encontrei nenhum comentário do Ministro da Ciência e Tecnologia, nenhum comentário do Ministro da Educação, nenhum comentário do chefe do Poder Executivo. Talvez o fato não seja relevante o suficiente para atrapalhar o fim de semana destes ilustres senhores."
Precisamos fazer algumas considerações sobre esta tragédia. Segundo o filósofo Alfred Whitehead, uma tragédia é “contemplar sem comoção o desenrolar de fatos graves”, ou seja, é a omissão sem remorso. Neste contexto, será que o incêndio na coleção do Butantan servirá de alguma coisa? Temo que não. Será que a sociedade em geral realmente se comove com a perda deste imenso patrimônio da humanidade ou tem noção de sua gravidade? Pesquisei na web manifestações sobre o ocorrido e encontrei apenas duas. Uma foi escrita por Hugo Fernandes Ferreira, aluno de pós-graduação UFPB e outra no Estadão, pelos pesquisadores Hussan Zaher e Miguel Trefaut, respectivamente o atual e o ex Diretor do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo. Além do fato de terem sido escritos por pesquisadores ligados à Zoologia, os dois manifestos também denunciam o descaso com as coleções cientificas em todo o Brasil. Os descasos ocorrem tanto na forma como estes acervos tem sido guardados em prédios sem condições de espaço e segurança para, na ausência de políticas para coleções zoológicas e na falta de recursos humanos. Não encontrei nenhum comentário do Ministro da Ciência e Tecnologia, nenhum comentário do Ministro da Educação, nenhum comentário do chefe do Poder Executivo. Talvez o fato não seja relevante o suficiente para atrapalhar o fim de semana destes ilustres senhores.

Mas tenho certeza que, se o Museu do Futebol no complexo do Maracanã tivesse sido completamente destruído por um acidente, traria mais comoção e atenção que o revoltante acidente do Butantan. 

O incêndio no Butantan foi extremamente grave. Muito grave mesmo. Tão grave quanto seria um grande incêndio em um importante museu do mundo como o Louvre, o Metropolitan, o Guggenheim, ou o British Museum. Pode parecer exagero comparar uma coleção cientifica com o patrimônio cultural depositado nestes museus e muitas obras insubstituíveis são patrimônio cultural da humanidade. No entanto, acidentes assim são extremamente improváveis nestes museus, que contam com sistemas eficientes de proteção, estão em edificações adequadas e são tratados como patrimônio pela sociedade dos países onde se encontram.

No entanto, animais diferem de obras, sejam livros, quadros ou películas, por dois fatores bastante óbvios. Animais não são resultado do trabalho de nenhuma pessoa e animais são organismos vivos. Desta forma, por lidarem com o destino de organismos vivos, as atividades de coleta, tombamento e manutenção do acervo de uma coleção cientifica devem ser desenvolvidas com ética e responsabilidade. Embora a licença para a coleta de organismos tenha recebido grande atenção das autoridades nos últimos anos, incluindo aí limitações esdrúxulas nos números de exemplares solicitados para pesquisa, a criação de museus de história natural, claramente, não são prioridade. O patrimônio biológico nacional não é prioridade para o governo e para o povo brasileiro, mesmo sendo o Brasil o maior detentor de diversidade biológica do mundo e 2010 ter sido escolhido o ano da biodiversidade pela ONU. 

Neste momento de consternação, devemos juntar forças para pedir respeito e atenção às coleções cientificas nacionais e aos profissionais que trabalham nestes acervos. Devemos pedir financiamento para as coleções, para a construção de edificações adequadas, para a formação de recursos humanos adequados e para a contratação de mais profissionais.


Sobre o autor:
Reuber Brandão é biólogo e doutor em ecologia, leciona manejo de fauna e manejo de áreas protegidas na Universidade de Brasília. Estuda répteis e anfíbios com paixão e acredita que estes animais dizem muito sobre a evolução e a conservação das paisagens naturais do Brasil. Analista Ambiental do IBAMA entre 2002 e 2006, participou diretamente da criação e ampliação de diversas unidades de conservação, especialmente na Amazônia e no Cerrado, onde concentra seus estudos atuais.

Foto: Danilo Guarda

domingo, 9 de maio de 2010

Por aí...


8ª Semana de Museus

Programação completa
Tema: Museus para a Harmonia Social
Realização: Instituto Brasileiro de Museus (Ibram)
Local: todo o Brasil
Data: de 17 a 23 de maio de 2010
Informações: www1.museus.gov.br

****************************************************************
Museu de Zoologia da USP - 8ª semana de museus

Programação:
18/05/2010 - 15h às 17h
Local: Auditório
PALESTRA - A Inserção da Museologia Brasileira no Plano Internacional
Carlos Roberto Brandão - Presidente do ICOM-BR
22/05/2010 - 15h às 17h
Local: Auditório
MESA-REDONDA - Museus e Centros de Ciências - desafios comuns
Marcelo Firer - Diretor Museu Exploratório de Ciências da Unicamp
Maria Isabel Landim - Museu de Zoologia da USP
Avenida Nazaré, 481 - Ipiranga - São Paulo - Fone: 2065-8100